Recuperações Judiciais no Brasil
Pois bem, peço licença, é com você que quero falar: Vivemos um momento crítico no Brasil e no mundo. Não fosse apenas, a insegurança jurídica, que assola nossa nação, ainda, nos é imposto, suportar, os efeitos de uma imprevista pandemia de proporções globais.
Empreender no Brasil virou uma aventura sem destino certo. Contudo, há um elemento que de tão escancarado está a demonstrar a fragilidade legal a que chegamos. Me refiro ao instituto denominado ¨Recuperação Judicial¨.
Em meio à mini-série criminal em que se transformou a política brasileira surge esse instrumento que a princípio deveria ¨recuperar empresas¨ preservando emprego, renda e recolhimento de tributos.
Ocorre que, na prática, vem revogando garantias constitucionais fundamentais da república, como contraditório, ampla defesa e todo o código de processo civil e Penal, além de leis específicas de vários setores empresariais.
Matérias de ordem pública, conhecidas em processos conexos, desobediência a ordem judicias, prevaricação de funcionários públicos federais, não pagamento de faturas por prestações de serviços ou entrega de bens a compradores ou tomadores de serviços, gravações, provas documentais, vídeos, áudios e tudo o mais que possa servir de prova incontestável no processo de Recuperação Judicial, estão sendo deliberadamente ignoradas por importantes figuras que compõem o processo.
Questões relativas à competências absolutas de cunho federal, leis setoriais, matérias complexas e novas, como é o caso da reforma trabalhista, por exemplo, o caso das empresas de segurança, que são regidas por lei federal em razão do trabalho com armas, munições e coletes a prova de bala, são magicamente levadas a um juízo que, sequer, tem conhecimento que existe o Sinarm e Delesp. Não sabem a diferença entre atividade fim e atividade meio e que da reforma trabalhista, resultou, a possibilidade da terceirização de atividades fins.
Mas, há algo pior a ser descortinado.
Quanto a um Magistrado, devemos presumir, que possuem o mínimo de preparo para, ao menos, vislumbrar o que os ¨chamados¨ administradores judiciais, que de administradores, muitas vezes, só possuem o nome, estão a fazer na propriedade alheia. Em muitos casos, sequer comparecem no local de trabalho e quando chamados a deliberar sobre questões de interesses dos sócios, invariavelmente demonstram corpo mole, criam dificuldades, não admitem não conhecer do assunto, cavam situações inexistentes e, por fim, encaminham ao juízo e ao Ministério Público o fruto de uma piada que denominam relatório. Do alto de sua ¨toga administrativa¨ e da soberba de sua ignorância empresarial, jamais imaginariam o tamanho do estrago que causam, quando, claramente não demonstram preparo algum para gerir determinadas empresas, menos ainda, recuperá-las.
Verifica-se também, muitos casos, pelo país, a existência de quadrilhas, extremamente organizadas, enraizadas em diversos estados da federação, para delapidar todo o patrimônio das ¨recuperandas¨. Contadores, advogados, administradores, interventores, imobiliárias, compradores de créditos (todos em conluio e que, logo, adquirem os bens imóveis das empresas, sempre, por preços imensamente inferiores ao valor de mercado) como um bando de carniceiros, passam a ditar o que é certo ou errado, conforme os seus interesses ou de seus patrocinadores, em alguns casos, os próprios empresários, visando atingir esse ou aquele sócio indesejável.
Por sócio indesejável, por exemplo, entendam, aqueles que descobriram ou procuram descobrir o verdadeiro motivo da falta de caixa na empresa.
Um show de horrores vem ocorrendo em ¨Recuperações Judiciais¨ no Brasil.
Das sábias palavras do fantástico e saudoso jurista mato-grossense José Victor Gargaglione que, do alto de sua formação jurídica raiz, ensinava com refinada perfeição, que o que não está nos autos, não está no mundo, ao oportuno e conveniente sistema, já careca de usual, ligado a decisões nas quais: o que está incontroverso, claro e patente nos autos, pode ou não está no mundo, depende dos interesses, do poder econômico e da influência dos interessados e, sobretudo, dos operadores daquele direito.
Saudoso e querido mestre - soubesses, a que ponto iríamos chegar. Que experiências jurídicas e processuais seus alunos viriam vivenciar e que, certamente, está longe de findar-se!!! Algo que, se tipificado criminalmente, facilmente se enquadraria, para ser suave, em uma espécie de ¨falsidade ideológica judicial.¨
Uma cegueira deliberada apoderou-se de boa parte de nosso sistema jurídico a ponto de se negar a própria prestação jurisdicional, aos que, esperançosos de verificar possíveis saídas, visando preservar, muitas vezes, 40 ou 50 anos de empreendedorismo, se lançam ao precipício sem saber, que na maioria da vezes, arriscar-se-á a entregar seus anos de labuta, seu patrimônio e todo o seu conhecimento a um administrador que a lei adverte necessitar possuir formação jurídica, econômica, contábil ou em administração de empresas.
Cabe lembrar, que a lei, não faz qualquer menção de experiências em formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, tráfico de influência, prevaricação, extorsão, falsidade ideológica, conluios ou vazamento de informações privilegiadas aos jaburus que circundam, sorrateiramente, toda e qualquer recuperação judicial no Brasil para, ao depois, receberem polpudos valores, via terceiros, por seus abomináveis e incompetentes serviços.
Cabe notar mais uma vez, que a regra jurídica, meio em moda, hoje é: o que está nos autos, pode ou não estar no mundo, depende só do patrocínio. Não há embargos de declaração, agravos, rescisórias ou sucedâneos recursais que dê fim nisso.
A maioria dos processos, sobretudo nos dias de hoje, para serem resolvidos, basta seguir o dinheiro, antes de, midiaticamente e com mira ¨snaiper¨ atingir esse ou aquele empreendedor, sem a certeza inabalável do que realmente levou a empresa ao estado de insolvência. É asqueroso isso.
Na verdade, o administrador judicial ou ¨interventor¨ deveria se portar como um verdadeiro auxiliar do juízo e do Ministério Público, visto que está inserido no elenco de particulares colaboradores da justiça, não se prestando a representar, ocultamente, interesses de advogados, sócios retirantes, imobiliárias, contadores, credores ou quem quer que seja.
Aliás, quanto aos sócios retirantes é dever do administrador buscar saber o porque de sua saída, sua vida pregressa, seus parentes próximos, sua rotina na empresa e sobre suas habilidades sobrenaturais de prever o futuro da empresa com tanta precisão. Para isso, é necessário muita experiência anterior ou um profundo conhecimento das contas da empresa.
Muitas e muitas vezes, esse sócios retirantes, são ¨macacos velhos¨ conhecidos da Receita Federal, das Fazendas Públicas Estaduais e Municipais, de idosos políticos e raposas daquele estado, olhando-se com mais atenção, encontra-se um extenso laranjal espalhado pela cidade e uma relação infinita de empresas em que aquele sócio retirante e com poderes sobrenaturais fundou, geriu com um revezamento frenético de laranjas e, aos depois, quebrou ou pediu recuperação judicial.
Quanto aos laranjas, com raríssimas exceções, alguns viram fazendeiros, estão engalfinhados pelos bairros da periferia, velhos, cansados, acabados, miseráveis, descartados e sem qualquer espécie de apoio daquele sócio retirante.
A engenharia jurídica criminal que vem envolvendo recuperações judiciais bilionárias no país, ensejaria um filme mafioso de bilheteria recorde garantida.
Cumpre registrar, aos empresários desavisados que, após a decretação da falência, inicia-se uma correria desenfreada para que, no máximo, 180 dias, todo o patrimônio da empresa (moveis e imóveis) já estejam nas mãos de terceiros.
Verifica-se também, até, relação de parentesco entre administradores judiciais e vistosos advogados, os quais andam por corredores dos fóruns vestidos como ¨menudos¨ sem perceber o ridículo a que se prestam quando verdadeiramente descobertos seus reais interesses e práticas abomináveis.
A coisa é tão cabulosa e rentável, que inúmeros magistrados, no país, tem pedido exoneração (demissão) de seus cargos de juízes para, espantosamente, reaparecerem no mercado jurídico como advogados ligados àqueles escritórios que antes lhe peticionavam ações bilionárias de recuperações judiciais.
Tanto é verdade, que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instaurou inúmeros inquéritos nos últimos anos, para investigar a conduta de magistrados que conduzem ou conduziram casos de falências e recuperações judiciais. Em um deles, um juiz fora aposentado compulsoriamente em razão de uma suposta atuação irregular ao lado de um íntimo administrador judicial. Em outro caso, um juiz teve de prestar longos esclarecimentos sobre sua constante relação com uma das partes no processo de recuperação.
Outro exemplo, o de um ex-juiz de recuperações judiciais em São Paulo, que deixou o judiciário em maio de 2021 para integrar os quadros de uma banca de conhecidos advogados ligados a uma das maiores administradoras judiciais do Estado e no mês seguinte à exoneração, compareceu, como representante do escritório, à uma reunião relativa ao Hotel Maksoud Plaza, na capital paulista. O icônico hotel, então foi vendido, pelo preço simbólico de 70 Milhões. O processo tramita na 1ª vara de Falências e Recuperações Judiciais, na qual o ex-juiz atuou.
Para não tornar extenso o presente artigo, cita-se, apenas mais um exemplo de complexidade compreensiva: determinada rede de lojas de camisaria, com mais de 450 lojas espalhadas pelo Brasil, muito conhecida na cidade de São Paulo por ter iniciado suas atividade e a exercida por 05 décadas na capital paulista, teve seu pedido de Recuperação Judicial deferido para tramitar na cidade de Cuiabá, Estado de Mato Grosso, porém, sua estrutura administrativa permanece em São Paulo e, para espanto geral, o administrador nomeado possui escritório no Rio de Janeiro. Dessa forma temos os proprietários da empresa morando em São Paulo, o processo tramitando em Cuiabá e o administrador com escritório profissional no Rio de Janeiro. A causa envolve valores próximos a 02 Bilhões de reais e sua administração encontra-se, por assim dizer, nas nuvens, entre SP, RJ e MT.
Espantoso, não!!!
Muitos desses advogados, verdadeiros ¨mestres¨ quando o assunto é ¨bônus¨mesmo com contratos assinados em que já constam os honorários previstos em lei, vivem a cobrar propinas, sempre ao verificarem, antecipadamente, esta ou aquela decisão que favorecerá ¨momentaneamente¨ seu representado, alegando possuir todos os caminhos que levam a essa ou aquela decisão, após, verificando que seu cliente não possui mais recursos para bonificá-lo, passam a criar ou revelar fatos que, antes, propalava para todos os seus clientes, serem possíveis e absolutamente legais buscando, claramente, por todos os meios, a decretação da falência de seu próprio cliente, para, agora, iniciar a delapidação patrimonial da ¨massa falida¨. Há casos, em que o próprio empresário(s) mancomunado com quadrilhas especializadas nesse tipo de crime, se beneficiam de todo esse esquema. (vide caso – Máfia das Falências espalhadas pela internet).
Esse é o ¨modus operandis¨ preferido dessas quadrilhas que já prejudicaram milhares de grandes empreendedores no Brasil.
Imagine-se, por fim, a decretação de falência fundamentada em informação falsa, levada ao processo pelo administrador/interventor judicial. As consequências morais, materiais e processuais disso? pois é, ocorrem rotineiramente e de forma dolosa.
Os crimes em espécie estão capitulados entre os artigos 168º ao 178º da Lei, contudo, deve-se atentar que servem e se aplicam a todos que de forma direta ou indireta, contribuírem para a decretação da falência, portanto, é extremamente importante verificar a conduta de cada um dos atores judiciais: Considerando que empresários, Sócios Retirantes, Juízes, Promotores, Administradores Judiciais, Gestores Judiciais, Peritos, Avaliadores, Contadores, Escrivães, Oficiais de Justiça, Leiloeiros e Advogados, por si ou por interposta pessoa, responderão na medida de sua culpabilidade.
Cabe ainda lembrar, que levar ao juízo, informações inverídicas ou distorcidas e que venham a causar a decretação de falência constitui crime odioso o qual poderá resultar, não só, na responsabilização criminal, mas, especialmente na reparação de danos morais, materiais e processuais.
É claro, é evidente, que não se está aqui a lançar tinta contra todos os magistrados, advogados, administradores, contadores, imobiliárias ou interventores que operam em Recuperações Judiciais, contudo, apenas advertindo o empresariado brasileiro para que, antes de se lançarem em aventuras processuais, verifiquem, a quantas andam esses processos em seus respectivos estados. O pau que dá em Chico, certamente deverá doer em Francisco.
Polícia Federal, Ministério Público Federal, Procuradoria Geral da República, Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Nacional de |Justiça, Presidente da República: quando se fala em Recuperação Judicial no Brasil, há muito mais dentro e fora dos autos do que nossa vã filosofia possa imaginar.
O poder dos que dominam é que decide sobre a constituição do direito e da justiça na Pólis. Justiça é o resultado de um acordo entre os homens e este acordo estabelece o meio termo entre fazer injustiça sem ser penalizado, que seria a tendência fundamental do egoísmo humano, e sofrer injustiça sem poder se defender ou se vingar.
Na Pólis Grega (cidades estados), o decisivo não é ser justo, mas parecer justo. O homem que se torna verdadeiramente justo parece injusto diante dos outros homens, podendo até morrer crucificado, e vice-versa, o homem que sabe ser injusto sem parecer injusto passa por justo no meio dos outros homens. Ensinavam os sábios antigos.
Haja Recurso, Intervenções de Terceiros, Agravos, Ações Rescisórias, Representações...., haja, haja, haja, ou melhor, Aja, Aja, Aja, mas, com a justiça à frente dos olhos e dirigindo a caneta para o ideal social da boa justiça, afinal, falhando os investidos nos poderes jurisdicionais ou, sendo usados e enganados por raposas velhas, conhecidíssimas nos segmentos empresariais que atuam, não haverá mais em quem acreditar, senão, na justiça divina, essa não há de falhar.
Por tudo isso, senhores empresários, se forem intentar uma Recuperação Judicial no Brasil ou, se já possui uma em andamento, passe para um café, não vão perder viagem!!!
Salmen Ghazale
Advogado